CARBÚNCULO HEMÁTICO (ANTRAZ): UMA ZOONOSE IMPORTANTE NO RIO GRANDE DO SUL

ANTHRAX: A IMPORTANT ZOONOSIS IN RIO GRANDE DO SUL

Tassinari dos Santos, Hélvio ( [1])

Resumo
O carbúnculo hemático é uma das zoonoses mais importante na região da Campanha e Fronteira-oeste do Rio Grande do Sul onde apresenta-se de forma endêmica causando elevados prejuízos tanto pela perda de animais como pela sua transmissão para o homem. No presente trabalho são abordados aspectos relacionados ao agente, epidemiologia, vias de transmissão e disseminação bem como as várias formas de apresentação da enfermidade nas diversas espécies domésticas e no homem. Comenta-se a importância do diagnóstico preciso, o tratamento e as medidas para o controle da enfermidade.

Palavras chaves: Carbúnculo hemático, Antraz, Zoonose, Epidemiologia.

 

Abstract

The anthrax is one of the most important zoonosis in the open field country in the west frontier of Rio Grande do Sul – Brazil, where it is presented in an endemic form causing elevate damages not only by the lost of animals, but also by its transmission to human beings. In this work we present the aspects related to the agent, epidemiology, transmission and dissemination, as well as the different rout in which the diseases are presented in the different domestic species and in the man. We also focus on the importance of a precise diagnostic, the treatment and the preventive methods for prophilaxis diseases.

 

Key-works: Anthrax, Zoonosis, Epidemiology

 

Introdução

            O carbúnculo hemático ou antrax, é uma enfermidade infecto-contagiosa, cosmopolita e altamente fatal que atinge mamíferos domésticos e selvagens, o homem e em circunstâncias especiais também as aves.

Conhecido desde o início da humanidade, foi a quinta praga do Egito no século XV A.C. como uma epidemia que grassava nas margens do rio Nilo atingindo cavalos, jumentos, camelos, bovinos e ovinos como cita a Bíblia Sagrada no Êxodo, capítulo 9, vers. 4 e 6.

Sua importância histórica deve-se a que seu agente o Bacillus anthracis foi a primeira bactéria observada microscopicamente por Pollender em 1849 e correlacionada como agente etiológico de uma enfermidade por Devaine em 1860. Entretanto coube Kock em 1876, cultivar o agente “in vitro”, reproduzir e provar a transmissibilidade de uma enfermidade, reconhecer os esporos e atribuir a eles a difusão da doença. Em 1881, Pasteur em Pouilly-le-Fort (França) utilizando o B. anthracis provou pela primeira vez a possibilidade de uma inoculação preventiva ao desenvolver uma vacina contra a enfermidade.

LANGENEGGER (1994) considera o carbúnculo hemático como uma doença rara no Brasil apresentando-se de forma esporádica no Vale do Paraíba até o Rio de Janeiro e sul de Minas Gerais, no nordeste no Rio Grande do Norte e na região da Campanha e da Fronteira-oeste do Rio Grande do Sul.

No Rio Grande do Sul, segundo SANTOS (1999) durante mais de dez anos e mais de trezentos materiais suspeitos de carbúnculo hemático proveniente de animais da Depressão Central e Planalto Médio recebidos pelo laboratório de Doenças Infecciosas do Curso de Medicina Veterinária da Universidade Federal de Santa Maria, não foi encontrado nenhum caso positivo. 

A maior incidência da enfermidade ocorre na região da Campanha e na Fronteira-Oeste do Estado onde o carbúnculo hemático tem sido responsável por grandes perdas, tanto sob a forma de surtos epidêmicos nos animais, como pela alta contagiosidade para a espécie humana (TASSINARI DOS SANTOS, 1988, 1994; SCHILD et. al., 1988,1991; FERREIRA et al., 1990; SANTOS, 1999).

TASSINARI DOS SANTOS (1994), identificou a morte de 784 animais durante surtos da enfermidade em 13 propriedades no município de Uruguaiana em um período de 4 anos, com maior incidência nos meses de março a junho, tendo a infecção se transmitido a 5 trabalhadores rurais.

O caráter agudo da doença nos animais dificulta qualquer tipo de tratamento resultando em um elevado número de mortes e grandes prejuízos aos pecuaristas, que são acentuados quando há envolvimento humano.  A morte de 77 animais e as despesas médico-hospitalares com três pacientes humanos atingidos pela enfermidade em uma única propriedade rural em Uruguaiana, ocasionou um prejuízo de US$ 14.155,50 em apenas 45 dias (TASSINARI DOS SANTOS, 1992).

 

Etiologia

Sendo pouco exigente, o Bacillus anthracis cresce saprofiticamente em solos ricos em matéria orgânica, com tendência a alcalinidade e, desde que haja temperatura e umidade favoráveis, pode produzir grandes quantidades de esporos na superfície do solo (MANCHEE et al, 1981). A presença de nutrientes orgânicos como fezes e líquidos corporais de animais propiciam não só a viabilidade dos esporos, como estimulam sua germinação e proliferação de forma saprofítica no meio ambiente (TITBALL e MANCHEE, 1987).

Embora a forma vegetativa do bacilo seja pouco resistente, sendo destruído pela simples putrefação do cadáver e pela ação dos desinfetantes comuns, seus esporos ao contrário, resistem a altas temperaturas podendo permanecer no solo e nos materiais contaminados por mais de 70 anos  (LESING e OIE, 1984).

Ainda que todas as amostras se comportem antigenicamente idênticas por possuírem a mesma estrutura da membrana celular, ocorrem variações quanto sua apresentação epidemiológica e a sua patogenicidade. Uma amostra de B. anthracis que infecta suínos em Papua (Nova Guiné) é responsável por graves surtos da doença porém, a exceção dos cobaios, a mesma não é transmitida a outras espécies animais (BLOOD, et. al., 1979). A variação da patogenicidade está condicionada a amostra do bacilo, em função de sua complexa toxina e da experiência antigênica prévia do animal.

 

Patogenia

  Após a penetração, o esporo do B. anthracis germina e multiplica-se em células vegetativas que revestem-se de uma cápsula formada por um polipeptído-poli-glutamato, o qual lhe confere uma proteção contra a fagocitose, ainda que essa não possua ação tóxica contra os componentes antigênicos do soro sangüíneo e sobre os fagócitos (KENNETH, 2000).

A bactéria produz uma potente e complexa exotoxina, composta por três frações termolábeis que além do caracter antigênico, determinam a potência da amostra em função da suas combinações. São elas:

a) Fator I - fator edematoso (EF): é uma adenilase-ciclase sendo responsável pela formação de edemas;

b) Fator II - fator antígeno protetor (PA): enzimas que potencializam as outras frações, sendo inativa quando sozinhas;

c) Fator III - fator letal (LF): que é essencial para o efeito letal da toxina do B. anthracis sobre o organismo animal.

Estas frações quando sozinhas não possuem efeitos tóxicos no organismo, porém as suas combinações as tornam extremamente potentes causando efeito letal (PA+FL), efeito edematoso (EF+PA) e edema, necrose e efeito letal quando presente as três frações juntas (EF+PA+LF), figura 1.

FIGURA 1. INTERAÇÃO DOS FATORES EDEMA (EF), ANTÍGENO PROTETOR (PA) E LETAL (LF)

Fatores

Edema

Letal

Imunitário

I

 

-

-

II

-

-

++

III

-

-

-

I+II

+

-

++

I+III

-

-

+

II+III

-

++

++

I+II+III

+++

+++

+

Assim sendo, os três principais componentes que determinam a virulência do B. anthracis são a cápsula bacteriana, o fator edema e o fator letal de sua toxina, que são fundamentais para a instalação e proliferação junto ao ponto de infecção.

Embora haja a migração de leucócitos para essa área, os bacilos não são fagocitados e resistem as defesas orgânicas devido as exotoxinas com poder letal de destruição e supressão dos neutrófilos. Após vencer as barreiras iniciais, o agente invade a corrente circulatória e produzindo uma septicemia mortal.

O bloqueio dos capilares devido a grande quantidade de bacilos até 109 bactérias/ml de sangue encontrado nos animais mortos foi considerado como causa de morte. Porém já foi comprovado que ao redor de 3x106 bacilos/ml é suficiente para provocar a morte em animais inoculados, a qual sobrevêm pela depleção de oxigênio e aumento da permeabilidade vascular com insuficiência renal aguda, falência cardíaca e respiratória, seguido do choque secundário devido a anóxia final (TITBALL e MANCHEE, 1987; KENNETH, 2000).

 

Vias de eliminação e transmissão

Logo após a morte do animal ocorre uma intensa bacteremia chegando a 109 bactérias/ml de sangue as quais invadem a carcaça e como conseqüência todos os líquidos orgânicos tornam-se altamente bacilíferos, incluindo a urina e as fezes (HOWARD, 1978). Os bacilos ao entrarem em contato com o ar esporulam contaminando o meio ambiente. Esses em condições favoráveis de solo, temperatura e umidade germinam produzindo novas gerações determinando altas concentrações de esporos na superfície do solo.

Assim as pastagens e aguadas contaminadas com líquidos orgânicos de animais mortos, são as principais fontes de contaminação da enfermidade para bovinos e ovinos sendo importante também para os eqüinos. Nessa última espécie a maioria dos óbitos tem origem a partir da  infecção cutânea, quando esses animais transportam peles e couros de animais mortos pela enfermidade.

A alimentação com farinha de ossos não autoclavada contaminadas com esporos do B. anthracis foi responsável por grandes surtos da doença no passado. Os fômites confeccionados com peles de animais vitimados pela enfermidade como buçais e maneias, tem sido responsáveis por acidentes fatais em eqüinos e ovinos. A contaminação das mangueiras e banheiros com esporos de B. anthracis é uma das principais causa de surtos em rebanhos de ovinos após a esquila (SANTOS, 1999).

Os tabanídeos e as moscas dos estábulos (Stomoxis spp.) são importantes fontes de infecção já que podem transmitir a enfermidade de forma mecânica para os animais e para o homem até 4h após haverem se alimentado de animais em bacteremia (KOLESNIK et. al., 1987).

 

SENSIBILIDADE DAS ESPÉCIES E FORMAS DE APRESENTAÇÃO

A transmissão da enfermidade para os animais e para o homem através do contato direto com animais mortos e com materiais contaminados já era conhecida por Moisés a 35 séculos atrás e citada na Bíblia no Livro Levíticos, capítulo 11, versículos 39-40, quando o mesmo exprimia sob a forma de Leis Divinas, as primeiras medidas de defesa sanitária, as quais são atuais até hoje.

O B. anthracis infecta os mamíferos em geral à exceção de uma espécie de porco anão e de ovinos da raça Argelina que são resistentes a infecção, não se determinando até o momento se a imunidade é de origem genética ou não. Afora essas, todas as outras espécies são sensíveis a infecção pelo bacilo, mas a sensibilidade ao desenvolvimento da doença varia com a espécie, a via de penetração e estado imunitário prévio.

São mais sensíveis por ordem os herbívoros, suínos, homem e os carnívoros não havendo diferenças nas incidências da infecção em relação ao sexo, idade e raça dos animais. As aves são refratárias podendo desenvolver uma infecção fatal sob determinadas condições como a baixa da temperatura corporal.

Nos animais o carbúnculo hemático apresenta-se sob três formas distintas:

1. forma super aguda ou apoplética: acomete mais os bovinos e ovinos, sendo os animais encontrados mortos ou agonizantes, sobrevindo a morte rapidamente. São observadas intensas hemorragias pelas aberturas naturais e a putrefação é rápida, figura 1;

2. forma aguda: ocorre principalmente em eqüinos e bovinos os quais apresentam hiperterrmia, congestão e edema pulmonar intenso, cianose das mucosas, dispnéia, edemas generalizados, transtornos digestivos, sobrevindo o coma e a morte em 24-48h, figura 2, 3;

3. forma sub-aguda: acomete normalmente suínos, mais raramente eqüinos e bovinos, o que leva a uma dificuldade no diagnóstico. Os animais apresentam febre, dispnéia, edema de glote, estertores e transtornos digestivos com diarréia sanguinolenta, ocorrendo a morte em 48-72h.

Na espécie humana a doença manifesta-se sob duas formas distintas:

1. forma cutânea: também denominada de pústula maligna ou ferida do esquilador, é caracterizada pela febre alta e o desenvolvimento de uma reação inflamatória intensa, geralmente circular, com área de necrose central e repercussão no linfonodo correspondente. A rápida evolução dessa lesão pode determinar uma septicemia ou toxemia grave que, caso não seja tratada rapidamente leva o indivíduo ao coma e morte em poucas horas, figuras 4, 5, 6;

2. forma pneumônica: tem origem a partir da inalação de esporos do B. anthracis. Essa forma é geralmente fatal e caracteriza-se por provocar uma pneumonia gangrenosa de difícil diagnóstico face aos sinais clínicos pouco característicos com  formação rápida de edema agudo e necrose pulmonar.

 

Diagnóstico

Várias enfermidades podem causar a morte súbita nos animais as quais muitas vezes são atribuídas ao carbúnculo hemático. As mais comuns são as produzidas pelos clostrídios como o carbúnculo sintomático (Clostridium chauvoei) na sua forma super-aguda, as enterotoxemias e mal súbito (C. perfringens), hemoglobinúria bacilar (C. novyi tipo D), intoxicação por veneno de ofídios do gênero Bothrops, a babesiose por B. bovis e a morte devido a descargas elétricas (raios), motivo pelo qual o diagnóstico diferencial se faz necessário.

O diagnóstico do carbúnculo hemático normalmente é realizado laboratorialmente com o auxílio da necropsia  em função da morte rápida, o que impede na maioria das vezes a observação dos sinais clínicos.

A rápida putrefação da carcaça, o “rigor mortis” ausente ou incompleto, os derrames de sangue não coagulado pelas aberturas naturais e edemas generalizados acompanhados de hepatomegalia e, principalmente extensa esplenomegalia por vezes com áreas de edemas gelatinosos, são lesões indicativas de carbúnculo hemático. Porém nos casos super-agudos são encontradas poucas lesões características o que dificulta o diagnóstico, por esse motivo a colheita de material deve ser realizada de preferência por uma pessoa habilitada.

Particularmente a congestão e edema pulmonar agudo em eqüinos (fig.3) e o edema de glote em suínos decorrentes de reação alérgica às toxinas, podem ser as únicas lesões encontradas. Elas podem levar o animal à morte por anóxia ou toxemia antes que ocorra uma bacteremia acentuada(KOLESNIK, et. Al., 1987), o que dificulta o diagnóstico bacteriológico.

Nos casos de septicemia o sangue, fragmentos de órgãos e os ossos longos são materiais úteis para um diagnóstico preciso, porém nos casos de mortes super-agudas sem bacteremia intensa e naqueles com edema de glote, os linfonodos regionais são o melhor material para o diagnóstico (TASSINARI DOS SANTOS, 1994).

A confirmação do agente através de impressões de tecidos e esfregaços de sangue corados para a identificação da cápsula do bacilo são importantes meios de diagnóstico, entretanto apresentam particularidades que poderão induzir ao erro de diagnóstico, além disso expõem o homem à infecção já que esses métodos não destroem os esporos do B. anthracis (HOWARD, 1978).

A confirmação do diagnóstico mais precisa é realizada pela cultura e a identificação do B. anthracis através da inoculação em animais de laboratório, teste do colar de pérolas, o uso do bacteriófago e caracterização bioquímica do bacilo (MANCHEE et. al. 1981, SANTOS et. al., 1988).

 

Tratamento e profilaxia

A morte rápida dos animais em sua grande maioria sem apresentação dos sinais clínicos impede a realização do tratamento curativo. Porém quando possível o tratamento com antibióticos tem demonstrado bons resultados tanto nos animais como no homem.

A penicilina por sua ação bactericida e as tetraciclinas em altas doses tem sido os antibióticos de escolha para o tratamento. Outros antibióticos como o cloranfenicol e as sulfonamidas também podem ser utilizadas porém são menos efetivas que os anteriores (MERCK, 1967).

A profilaxia do carbúnculo hemático baseia-se na destruição das carcaças de animais mortos, no manejo durante a esquila e na vacinação sistemática dos animais.

A destruição dos cadáveres vitimados pela enfermidade é melhor método para evitar a contaminação do solo. Esses devem ser incinerados preferencialmente no próprio local, para evitar a contaminação do meio ambiente pelos derrames de líquidos orgânicos durante o transporte.

A abertura e a esfola das carcaças de animais mortos pela enfermidade levam a esporulação das formas vegetativas e devem ser evitadas por três motivos:

1) para evitar a infecção para o homem;

2) a abertura propicia a esporulação do agente e conseqüente contaminação e disseminação no meio ambiente;

3) por que a putrefação destrói as formas vegetativas do bacilo impedindo a sua esporulação.

O manejo sanitário dos ovinos na época da esquila é fundamental para evitar tanto o Carbúnculo Hemático como outras enfermidades telúricas como o tétano e as clostridioses.

A  contaminação das lesões cutâneas ocorridas durante a esquila por esporos de B. anthracis tem sido uma das principais causas de surtos de Carbúnculo Hemático em ovinos, por isso deve-se evitar que a mesma seja realizada junto a terra e em cima de couros de animais mortos, promover a desinfecção das feridas e só realizar banhos sarnicidas e piolhicidas cerca de 7 a 10 dias após, quando da completa cicatrização das lesões. 

Na América do Sul, a vacina contra o carbúnculo hemático é elaborada com uma amostra esporulada, descapsulada e avirulenta (amostra Sterne) que tem apresentado um período de proteção variável entre 6 e 12 meses, dependendo da intensidade da agressão sofrida pelos animais diante da contaminação ambiental, sem que se tenha efeitos indesejáveis.

Segundo TASSINARI DOS SANTOS (1993; 1994) na região da Fronteira-oeste do Rio Grande do Sul onde a incidência da enfermidade é alta, a proteção oferecida pela vacina em algumas propriedades é reduzida, sendo observadas mortes após o sétimo mês da vacinação, devendo os animais serem revacinados anualmente a cada 6 meses sob pena de ocorrerem mortes.

 

Conclusões

O carbúnculo hemático apresenta-se de forma endêmica no Rio Grande do Sul principalmente na região da Fronteira-oeste por que o tipo de solo favorece a manutenção e proliferação, perpetuando de forma saprófita o B. anthracis no solo.

A maioria dos surtos da enfermidade nessa região ocorre no outono, nos meses de abril a junho, seguido da primavera nos meses de setembro à novembro, por que a temperatura do solo e a unidade relativa do ar é mais favorável para o desenvolvimento do bacilo e conseqüente esporulação aumentando a contaminação na superfície do solo, já que no verão e inverno as temperaturas extremas impedem o desenvolvimento do mesmo.

A variação das formas clínicas de apresentação do carbúnculo hemático nas diferentes espécies animais seguidamente induzem aos erros de diagnóstico, principalmente quando o mesmo é realizado apenas clinicamente. Recentemente numa propriedade em Uruguaiana casos da doença de forma faringeana em bovinos, semelhante as que ocorrem em eqüinos, foram responsáveis por 37 mortes. Como conseqüência, um trabalhador rural que tentava realizar um tratamento contra o edema de pescoço, pensando tratar-se de envenenamento por ofídio, acabou se infectando com o B. anthracis.

No homem a forma mais freqüentemente encontrada é a pústula maligna a qual tem sido confundida com picada de insetos ou infecções por outros agentes. Atualmente com a generalização do uso dos antibióticos que são vendidos e aplicados livremente em farmácias por leigos, o tratamento é realizado de forma ambulatorial sem que haja um diagnóstico preciso da enfermidade. Somente aqueles casos mais graves com reações gerais com presença de necroses extensas de pele, vômitos e sinais de septicemia e toxemia, é que chegam aos hospitais para uma melhor avaliação.

Esse fator limita uma avaliação precisa da incidência da enfermidade na espécie humana. Entretanto um inquérito epidemiológico realizado junto a médicos e trabalhadores rurais no município de Uruguaiana, demonstrou que os mais idosos informaram haverem conhecido pessoas que sofreram da moléstia ou contraído a enfermidade, já que na época dispunha-se de poucos recursos terapêuticos e a infecção tornava-se grave levando o paciente a procurar tratamento médico-hospitalar. 

Ainda que o diagnóstico laboratorial tanto animal como humano seja relativamente fácil, alguns aspectos na colheita de material e na realização dos exames devem ser levados em consideração para evitar erros repercutindo em um diagnóstico falho. Dentre esses cita-se a espécie animal e a forma clínica apresentada, o tempo decorrido entre a morte do animal e a colheita do material, o tipo de material colhido, a conservação do mesmo e o tipo de exame laboratorial realizado bem como as técnicas de coloração e os meios de cultura utilizados.

A falta de conhecimento sobre a doença por parte de pecuaristas oriundo de outras profissões ou regiões onde a enfermidade não é freqüente; a renovação da população campesina sem experiência com a doença; aliados com a falta de vacinação dos animais tem sido os principais fatores para o surgimento de surtos epidêmicos da enfermidade observados no estado do Rio Grande do Sul.



 Figura1. Morte super aguda em bovino                                                    Figura 4. Pústula maligna na perna,

                                                                                                                              após 72h de evolução.

 


Figura 2. Edemas generalizados em eqüino                                  Figura 5. Pústula malígna no braço com

                                                                                                                              cinco dias de evolução


 

 


Figura 3. Congestão e edema pulmonar de eqüino.             Figura 6. Pústula malígna seis dias pós-tratamento

 


 

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[1] Med. Vet. MSc. Prof. Fac. Zoot. Vet. Agron. PUCRS, Campus Universitário II. Uruguaiana, RS. E-Mail: hts@pucrs.campus2.br./ tassinari@bnet.com.br.